Narrador: Tróia destruída, os gregos matam todos os habitantes do sexo masculino, homens, rapazes ou meninos. Restam, apenas, algumas mulheres: as troianas. O coro recorda:
Coro ( vozes alternadas)
Era ontem.
O nosso último dia de ventura
Foi para Tróia o começo da morte.
Do alto das muralhas, nessa manhã,
Vi a praia e o mar
Desertos a perder de vista:
A frota tinha desaparecido.
Só no meio da planície, havia um grande cavalo de madeira
Com arreios de ouro cintilante.
Todo o povo troiano, em pé sobre a rocha da cidadela,
Gritava: “ A guerra acabou, foram-se embora;
- os gregos levantaram o cerco
- acabaram os nossos sofrimentos:
Colocai o ídolo de madeira na nossa Acrópole!
Consagrá-lo-emos a Pala Atena;
A nobre filha de Zeus
Que nos perdoou.”
Toda a gente gritava nas ruas.
Os velhos e as virgens,
Nas ombreiras das portas,
Perguntavam: “ Que aconteceu?”
E nós respondíamos: È a paz.”
Ataram-se cordas ao ídolo
Para o içar até ao templo de Atena.
Eu ajudei como todos.
Empurrei, puxei, esforcei-me.
O trabalho acabou ao fim do dia,
E toda a noite cantámos vitória
Ao som de flautas lídias,
E depois, uma a uma se apagaram,
Nas casas, as candeias brilhantes,
E as tochas fumegantes nas ruas.
Nós esgotados pela alegria,
Cantávamos ainda no escuro,
Em voz baixa: a paz! A paz!
Assim acabou o último dia de Tróia,
O nosso último dia de ventura!(…)
Narrador:
As mulheres troianas, entre elas a rainha Hécuba, profetisa semi-louca Cassandra e a princesa, Andrómaca, com o seu filhinho de peito, encontram-se reunidas, à espera de serem distribuídas como escravas pelos reis gregos, vencedores.
Um mensageiro, Taltíbio, é enviado a Andrómaca para lhe arrancar o filho, que os gregos não querem deixar vivo.:
(…)
Taltíbio ( vai junto de Andrómaca)
-Não me odeies.
Andrómaca:
-Porquê?
Taltíbio :
-Sou apenas um mensageiro.
Comunico-te, contrariado,
A nova decisão dos meus senhores.
Andrómaca:
-Sê claro.
Parece que tens medo de falar.
Taltíbio:
-O teu filho …
Andrómaca
-Separam-nos?
Taltíbio:
-Sim, de certa maneira…
Andrómaca:
Não teremos o mesmo senhor?
Taltíbio:
-Ele não terá senhor.
Andrómaca:
-Abandoná-lo-eis aqui?
Taltíbio:
-Queria preparar-te.
Andrómaca:
-Não quero saber dos teus escrúpulos.
Vamos, servo, despacha-te
Taltíbio:
-Vão matá-lo.
(Silêncio. Andrómaca aperta o filho contra ela e olha-o.
continua precipitadamente):
-Foi Ulisses
Disse diante da Assembleia dos Gregos:
“ Se deixarmos viver o príncipe herdeiro de Tróia,
O filho do poderoso Heitor,
Preparamos grandes trabalhos.”
A Assembleia deu-lhe razão (pausa)
Não o apertes tanto.
Dá-mo
(Ela resiste e afasta-se)
- Vá! Dá-mo.
Que podes tu fazer?
A tua cidade e o teu marido desapareceram.
Estás em nosso poder.
Será preciso que eu to arranque?
Julgas que o exército grego não é capaz
De vencer uma mulher?
Inclina-te perante as ordens,
Sê digna na desgraça.
Que será preciso fazer, ó deuses,
Para que nos dês o teu filho?
Ouve: não atraias sobre ti o ódio
Ou – quem sabe? – a vergonha.
Se irritas os militares,
Abandonarão o cadáver do teu filho aos abutres.
Se fores dócil,
Talvez te permitam enterrá-lo
E os nossos generais talvez te considerem
Com um olhar benévolo.
Andrómaca (aos soldados):
- Não lhe toqueis! Eu já o entrego
(os soldados afastam-se sem a perderem de vista)
Meu pequenino
Vais deixar-me.
Vais morrer. Sabes porquê?
O teu pai foi demasiado grande,
As suas virtudes serão a causa da tua morte.
Mentiram-me, o ano passado,
Quando me disseram que trazia no ventre
O futuro rei da Ásia
Das belas colheitas.
Dei à luz uma pobre, frágil vítima,
E dei aos gregos um mártir.
Tu choras! Agarras-te ao meu vestido
Com os dedinhos crispados,
será que adivinhas a tua sorte?
(bruscamente)
Sai da terra, Heitor, retoma a tua lança.
Massacra-os. Salva o teu filho!
(Pausa)
Ele não virá
Está morto.
Estamos sozinhos
Os dois, meu tesouro;
Não sou suficientemente forte
E não poderei resistir-lhes muito tempo.
Vão pegar em ti,
Vão lançar-te do alto das muralhas,
De cabeça para baixo. (Um grito) Ah!
(Pausa)
Corpo, corpo querido,
Tu ainda vives e cheiras tão bem!
(Beija-o)
Tinha orgulho ao dar-te o meu leite
Se eu soubesse, ter-te-ia sufocado
Com as minhas mãos
Enquanto te beijava
Beija-me,
Aperta-me muito,
Cola a tua boca à minha.
(Levanta-se)
Homens da Europa,
Vós desprezais a África e a Ásia
E chamais-nos bárbaros, creio.
Mas quando a gloríola e a cupidez
Vos lançam contra nós,
Pilhais, torturais e massacrais.
Quem são os bárbaros?
E vós Gregos, tão orgulhosos
Da vossa humanidade,
Onde estais?
Eu vos digo: nem um só de nós
Ousaria fazer a uma mãe
O que me fazeis a mim
Com a calma da boa consciência
(violentamente)
Bárbaros! Bárbaros!
Matais o meu filho por causa de uma prostituta.
( os soldados arrancam-lhe o filho)
Que vergonha para mim: não ter forças para
Proteger o meu filho
Maldito sejam os filhos de Ulisses.
Taltíbio (para os soldados):
- Levai-o. Vou ter convosco às muralhas.
(para si mesmo)
Missão verdadeiramente desagradável!
Bem ma podiam ter poupado.
Eu tenho coração.
Enfim é a guerra! (…)
Eurípedes, As Troianas
Coro ( vozes alternadas)
Era ontem.
O nosso último dia de ventura
Foi para Tróia o começo da morte.
Do alto das muralhas, nessa manhã,
Vi a praia e o mar
Desertos a perder de vista:
A frota tinha desaparecido.
Só no meio da planície, havia um grande cavalo de madeira
Com arreios de ouro cintilante.
Todo o povo troiano, em pé sobre a rocha da cidadela,
Gritava: “ A guerra acabou, foram-se embora;
- os gregos levantaram o cerco
- acabaram os nossos sofrimentos:
Colocai o ídolo de madeira na nossa Acrópole!
Consagrá-lo-emos a Pala Atena;
A nobre filha de Zeus
Que nos perdoou.”
Toda a gente gritava nas ruas.
Os velhos e as virgens,
Nas ombreiras das portas,
Perguntavam: “ Que aconteceu?”
E nós respondíamos: È a paz.”
Ataram-se cordas ao ídolo
Para o içar até ao templo de Atena.
Eu ajudei como todos.
Empurrei, puxei, esforcei-me.
O trabalho acabou ao fim do dia,
E toda a noite cantámos vitória
Ao som de flautas lídias,
E depois, uma a uma se apagaram,
Nas casas, as candeias brilhantes,
E as tochas fumegantes nas ruas.
Nós esgotados pela alegria,
Cantávamos ainda no escuro,
Em voz baixa: a paz! A paz!
Assim acabou o último dia de Tróia,
O nosso último dia de ventura!(…)
Narrador:
As mulheres troianas, entre elas a rainha Hécuba, profetisa semi-louca Cassandra e a princesa, Andrómaca, com o seu filhinho de peito, encontram-se reunidas, à espera de serem distribuídas como escravas pelos reis gregos, vencedores.
Um mensageiro, Taltíbio, é enviado a Andrómaca para lhe arrancar o filho, que os gregos não querem deixar vivo.:
(…)
Taltíbio ( vai junto de Andrómaca)
-Não me odeies.
Andrómaca:
-Porquê?
Taltíbio :
-Sou apenas um mensageiro.
Comunico-te, contrariado,
A nova decisão dos meus senhores.
Andrómaca:
-Sê claro.
Parece que tens medo de falar.
Taltíbio:
-O teu filho …
Andrómaca
-Separam-nos?
Taltíbio:
-Sim, de certa maneira…
Andrómaca:
Não teremos o mesmo senhor?
Taltíbio:
-Ele não terá senhor.
Andrómaca:
-Abandoná-lo-eis aqui?
Taltíbio:
-Queria preparar-te.
Andrómaca:
-Não quero saber dos teus escrúpulos.
Vamos, servo, despacha-te
Taltíbio:
-Vão matá-lo.
(Silêncio. Andrómaca aperta o filho contra ela e olha-o.
continua precipitadamente):
-Foi Ulisses
Disse diante da Assembleia dos Gregos:
“ Se deixarmos viver o príncipe herdeiro de Tróia,
O filho do poderoso Heitor,
Preparamos grandes trabalhos.”
A Assembleia deu-lhe razão (pausa)
Não o apertes tanto.
Dá-mo
(Ela resiste e afasta-se)
- Vá! Dá-mo.
Que podes tu fazer?
A tua cidade e o teu marido desapareceram.
Estás em nosso poder.
Será preciso que eu to arranque?
Julgas que o exército grego não é capaz
De vencer uma mulher?
Inclina-te perante as ordens,
Sê digna na desgraça.
Que será preciso fazer, ó deuses,
Para que nos dês o teu filho?
Ouve: não atraias sobre ti o ódio
Ou – quem sabe? – a vergonha.
Se irritas os militares,
Abandonarão o cadáver do teu filho aos abutres.
Se fores dócil,
Talvez te permitam enterrá-lo
E os nossos generais talvez te considerem
Com um olhar benévolo.
Andrómaca (aos soldados):
- Não lhe toqueis! Eu já o entrego
(os soldados afastam-se sem a perderem de vista)
Meu pequenino
Vais deixar-me.
Vais morrer. Sabes porquê?
O teu pai foi demasiado grande,
As suas virtudes serão a causa da tua morte.
Mentiram-me, o ano passado,
Quando me disseram que trazia no ventre
O futuro rei da Ásia
Das belas colheitas.
Dei à luz uma pobre, frágil vítima,
E dei aos gregos um mártir.
Tu choras! Agarras-te ao meu vestido
Com os dedinhos crispados,
será que adivinhas a tua sorte?
(bruscamente)
Sai da terra, Heitor, retoma a tua lança.
Massacra-os. Salva o teu filho!
(Pausa)
Ele não virá
Está morto.
Estamos sozinhos
Os dois, meu tesouro;
Não sou suficientemente forte
E não poderei resistir-lhes muito tempo.
Vão pegar em ti,
Vão lançar-te do alto das muralhas,
De cabeça para baixo. (Um grito) Ah!
(Pausa)
Corpo, corpo querido,
Tu ainda vives e cheiras tão bem!
(Beija-o)
Tinha orgulho ao dar-te o meu leite
Se eu soubesse, ter-te-ia sufocado
Com as minhas mãos
Enquanto te beijava
Beija-me,
Aperta-me muito,
Cola a tua boca à minha.
(Levanta-se)
Homens da Europa,
Vós desprezais a África e a Ásia
E chamais-nos bárbaros, creio.
Mas quando a gloríola e a cupidez
Vos lançam contra nós,
Pilhais, torturais e massacrais.
Quem são os bárbaros?
E vós Gregos, tão orgulhosos
Da vossa humanidade,
Onde estais?
Eu vos digo: nem um só de nós
Ousaria fazer a uma mãe
O que me fazeis a mim
Com a calma da boa consciência
(violentamente)
Bárbaros! Bárbaros!
Matais o meu filho por causa de uma prostituta.
( os soldados arrancam-lhe o filho)
Que vergonha para mim: não ter forças para
Proteger o meu filho
Maldito sejam os filhos de Ulisses.
Taltíbio (para os soldados):
- Levai-o. Vou ter convosco às muralhas.
(para si mesmo)
Missão verdadeiramente desagradável!
Bem ma podiam ter poupado.
Eu tenho coração.
Enfim é a guerra! (…)
Eurípedes, As Troianas